Espécies de Enterococcus:

Os enterococos são bactérias Gram-positivas anaeróbias facultativas que fazem parte da microbiota normal do trato gastrointestinal humano, mas podem atuar como patógenos oportunistas. São uma das principais causas de infecções hospitalares, incluindo endocardite, bacteremia, infecções urinárias e intra-abdominais.

Os enterococos são bactérias Gram-positivas anaeróbias facultativas que fazem parte da microbiota normal do trato gastrointestinal humano, mas podem atuar como patógenos oportunistas. São uma das principais causas de infecções hospitalares, incluindo endocardite, bacteremia, infecções urinárias e intra-abdominais.

O tratamento dessas infecções é um desafio devido à alta resistência antimicrobiana, especialmente à vancomicina (VRE), beta-lactâmicos e aminoglicosídeos.

Microbiologia

Características Gerais

  • Cocos Gram-positivos em cadeias curtas.
  • Crescem em condições extremas:
    • Na presença de 6,5% de NaCl.
    • Em pH 9,6.
    • Em temperaturas entre 10-45°C.
    • Resistentes a bile salts.
  • Produção de biofilme, aumentando sua persistência em dispositivos médicos.

Principais Espécies Patogênicas

EspécieInfecções Associadas
Enterococcus faecalisEndocardite, ITU, bacteremia, infecções intra-abdominais
Enterococcus faeciumInfecções hospitalares resistentes, VRE
  • E. faecalis representa 80-90% das infecções comunitárias.
  • E. faecium é frequentemente resistente a antibióticos e predominante em hospitais.

Mecanismos de Resistência

  • Resistência a beta-lactâmicos:
    • Enterococcus spp. têm proteínas ligadoras de penicilina (PBPs) com baixa afinidade.
    • Resistência intrínseca a cefalosporinas.
  • Resistência a aminoglicosídeos:
    • Impermeabilidade relativa → necessitam de um agente que afete a parede celular (beta-lactâmico ou glicopeptídeo) para ação sinérgica.
    • Resistência de alto nível → ocorre por mutações ribossomais e diminuição no transporte de aminoglicosídeos.
  • Vancomycin-Resistant Enterococcus (VRE):
    • Plasmídeos mediando resistência via genes VanA e VanB.
    • E. faecium é mais resistente que E. faecalis.
    • Clonal Cluster 17 (CC17) → Cepa predominante de E. faecium associada a surtos hospitalares.

Epidemiologia

  • Importante causa de infecção hospitalar, especialmente em pacientes críticos.
  • Fatores de risco:
    • Hospitalização prolongada.
    • Diálise e uso de cateteres venosos centrais.
    • Manipulação do trato gastrointestinal e urinário.
    • Uso de antibióticos de amplo espectro (ceftriaxona, fluoroquinolonas, glicopeptídeos).
  • Taxa de mortalidade associada ao VRE: 30%.

Manifestações Clínicas

1. Endocardite Infecciosa

  • E. faecalis é um dos principais agentes de endocardite em idosos.
  • Fatores de risco:
    • Próteses valvares.
    • Histórico de manipulação urinária.
    • Bacteremia persistente (>3 dias).
  • Diagnóstico:
    • Hemoculturas positivas persistentes.
    • Ecocardiografia transesofágica (ETE) → Sensibilidade aumentada para detectar vegetações.

2. Infecções do Trato Urinário (ITU)

  • Frequentemente associadas a cateterismo urinário e manipulações do trato urinário.
  • Raro causar bacteremia a partir de ITU.
  • Sintomas: Disúria, urgência urinária, febre em pielonefrite.

3. Bacteremia e Sepse

  • Enterococos são resistentes ao complemento, facilitando a bacteremia.
  • Fonte primária frequentemente intra-abdominal ou urinária.

4. Infecções Intra-Abdominais

  • Peritonite pós-cirúrgica e abscessos abdominais.
  • Enterococos raramente são o patógeno primário, mas são componentes de infecções polimicrobianas.

5. Meningite e Infecções do SNC

  • Mais comum após neurocirurgia ou trauma craniano.
  • VRE tem sido isolado em meningites hospitalares.

6. Infecções de Pele e Partes Moles

  • Feridas cirúrgicas contaminadas, úlceras de pressão e infecções de pé diabético.
  • Raramente causa fasciíte necrosante.

Diagnóstico

1. Cultura e Testes de Suscetibilidade

  • Determinar resistência a penicilina, vancomicina e aminoglicosídeos.
  • VRE deve ser identificado e monitorado epidemiologicamente.

2. Exames Complementares

  • Ecocardiograma transesofágico (ETE) → Avaliação de endocardite.
  • Hemocultura persistente → Indicativo de infecção profunda.

Tratamento

1. Endocardite

  • Beta-lactâmico + aminoglicosídeo (se sensível):
    • Ampicilina 2 g IV 4/4h + Gentamicina 1 mg/kg IV 8/8h.
    • Alternativa: Ampicilina 2 g IV 4/4h + Ceftriaxona 2 g IV 12/12h (se resistência a aminoglicosídeos).
    • Duração:
      • Válvula nativa: 4-6 semanas.
      • Válvula protética: ≥6 semanas.
  • Se resistência à penicilina:
    • Vancomicina 15 mg/kg IV 12/12h + Gentamicina.
  • Se VRE:
    • Linezolida 600 mg IV/VO 12/12h (monitorar mielotoxicidade).
    • Daptomicina 10-12 mg/kg IV/dia (bactericida, melhor para endocardite do lado direito).

2. ITU

  • Infecção não complicada (se sensível):
    • Amoxicilina 875 mg VO 12/12h por 7-10 dias.
    • Alternativa para alérgicos a penicilina: Nitrofurantoína 100 mg VO 12/12h.
  • Infecção complicada ou VRE:
    • Linezolida 600 mg VO/IV 12/12h.
    • Fosfomicina 3 g VO dose única.

3. Bacteremia

  • Se sensível:
    • Ampicilina 2 g IV 4/4h.
    • Alternativa: Vancomicina (se alergia a beta-lactâmicos).
  • Se VRE:
    • Linezolida ou Daptomicina.

4. Infecções Intra-Abdominais

  • Piperacilina/tazobactam ou Meropenem.
  • Se VRE → Linezolida ou Daptomicina.

Prevenção

  • Isolamento de contato para VRE.
  • Higienização rigorosa das mãos e equipamentos médicos.
  • Uso racional de antibióticos para evitar seleção de resistência.

Conclusão

As infecções por Enterococcus spp. são desafiadoras devido à resistência antimicrobiana. O tratamento requer combinações de beta-lactâmicos, aminoglicosídeos ou glicopeptídeos, e VRE exige alternativas como linezolida e daptomicina. A prevenção hospitalar é essencial para reduzir a disseminação desses patógenos.

🔍 Gostou do conteúdo? No app do InfectoCast você encontra protocolos, bulário, microbiologia, vacinação e muito mais em um só lugar.
👉 Clique aqui e conheça o app.

Referências

Arias CA, Murray BE. The rise of the Enterococcus: beyond vancomycin resistance. Nat Rev Microbiol. 2012;10(4):266-278. DOI:
10.1038/nrmicro2761

Murray BE. The life and times of the Enterococcus. Clin Microbiol Rev. 1990;3(1):46-65. DOI:
10.1128/CMR.3.1.46

Hindler JF, Wong-Beringer A, Charlton CL. Antimicrobial susceptibility testing of Enterococcus spp.: considerations for new CLSI guidelines. Clin Microbiol Rev. 2019;32(4):e00063-18. DOI:
10.1128/CMR.00063-18

O’Driscoll T, Crank CW. Vancomycin-resistant enterococcal infections: epidemiology, clinical manifestations, and optimal management. Infect Drug Resist. 2015;8:217-230. DOI:
10.2147/IDR.S54125

Bender JK, Cattoir V, Hegstad K, et al. Update on prevalence and antimicrobial resistance of Enterococci: 2019 report from the European Antimicrobial Resistance Surveillance Network (EARS-Net). J Antimicrob Chemother. 2020;75(7):1704-1712. DOI:
10.1093/jac/dkaa056

CLSI (Clinical and Laboratory Standards Institute). Performance standards for antimicrobial susceptibility testing; 31st edition. CLSI document M100-S31. 2021.

Posts Relacionados

Espécies de Fusobacterium:

As bactérias do gênero Fusobacterium são anaeróbios Gram-negativos, comumente encontrados na flora orofaríngea, gastrointestinal e genital humana. Apesar de serem parte da microbiota normal, certas espécies são reconhecidas como patógenos oportunistas associados a infecções graves, incluindo síndrome de Lemierre, abscessos orofaríngeos, sepse e infecções profundas de tecidos.

Francisella tularensis:

A Francisella tularensis é um pequeno cocobacilo Gram-negativo aeróbico, intracelular e altamente virulento, responsável pela tularemia, uma zoonose rara, mas potencialmente grave. A transmissão ocorre por vetores como carrapatos e mosquitos, contato direto com animais infectados, inalação de aerossóis contaminados e ingestão de água ou alimentos contaminados. A bactéria tem um baixo inóculo infeccioso (10–50 organismos) e pode ser usada como agente bioterrorista (Tier 1).

Escherichia coli:

A Escherichia coli (E. coli) é uma bactéria Gram-negativa aeróbia da família Enterobacteriaceae. É um dos principais componentes da flora intestinal humana, podendo atuar como um comensal, um patógeno entérico ou um patógeno extraintestinal. Essa bactéria é a causa mais comum de infecções do trato urinário (ITU), meningite neonatal e diarreia do viajante. Além disso, pode estar associada a infecções intra-abdominais, sepse e pneumonias nosocomiais.

Erysipelothrix rhusiopathiae:

O Erysipelothrix rhusiopathiae é um bacilo Gram-positivo pleomórfico, aeróbio ou anaeróbio facultativo, de crescimento lento, que pode causar infecções zoonóticas em humanos. Ele é notável por sua resistência intrínseca à vancomicina e por ser uma causa rara, mas relevante, de infecções cutâneas e sistêmicas.

Espécies de Enterobacter:

O gênero Enterobacter compreende bacilos Gram-negativos aeróbios e móveis, pertencentes à família Enterobacteriaceae. São comensais do trato gastrointestinal humano, mas podem atuar como patógenos oportunistas em infecções hospitalares, como pneumonias associadas à ventilação mecânica, infecções do trato urinário, bacteremia e meningite neonatal.

Espécies de Elizabethkingia:

As bactérias do gênero Elizabethkingia são bacilos Gram-negativos não fermentadores, associados a infecções nosocomiais graves, especialmente em neonatos, imunossuprimidos e pacientes de UTI. Estas bactérias são frequentemente multirresistentes a antibióticos, o que dificulta o tratamento.