A daptomicina é um antibiótico lipopeptídico cíclico com potente atividade contra bactérias Gram-positivas, incluindo Staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA) e Enterococcus faecium resistente à vancomicina (VRE). Seu mecanismo de ação envolve a rápida despolarização da membrana bacteriana, levando à morte celular sem lise. Este artigo explora as indicações, posologia, efeitos adversos, interações medicamentosas e farmacologia da daptomicina.
Indicações Clínicas
A daptomicina é aprovada pelo FDA para tratar:
- Infecções complicadas da pele e tecidos moles: causadas por microrganismos Gram-positivos suscetíveis, incluindo MSSA e MRSA.
- Bacteremia por S. aureus: incluindo endocardite do lado direito causada por MSSA e MRSA.
Uso “Off-label”:
- Endocardite causada por Enterococcus spp. resistente a vancomicina, penicilina e aminoglicosídeos.
- Infecções por VRE, incluindo bacteremia, infecções intra-abdominais, infecções do trato urinário e infecções de pele e tecidos moles.
- Terapia alternativa:
- Para endocardite da válvula nativa do lado esquerdo causada por MSSA (em vez de vancomicina).
- Infecções de próteses articulares por S. aureus e Enterococcus spp.
- Osteomielite vertebral nativa causada por S. aureus e Enterococcus spp.
Nota: A daptomicina não deve ser usada para o tratamento de pneumonia, pois é inativada pelo surfactante pulmonar.
Mecanismo de Ação
A daptomicina se liga à membranas celular bacteriana e causa rápida despolarização do potencial de membrana. A perda do potencial de membrana leva à inibição da síntese de DNA, RNA e proteínas essenciais para a vida celular bacteriana.
Formulação disponível
- Injetável: 500 mg em cada frasco-ampola
Posologia e Administração
- Infecção de pele e tecidos moles: 4 mg/kg IV a cada 24h
- Bacteremia por S. aureus e endocardite do lado direito: 6 mg/kg IV a cada 24h
- Endocardite:
- 10-12 mg/kg IV a cada 24h.
- Endocardite da válvula nativa esquerda por S. aureus: ≥ 8 mg/kg IV a cada 24h.
- Osteomielite: 6-8 mg/kg IV a cada 24h.
- Infecções por VRE: doses de 8-12 mg/kg IV a cada 24h podem ser necessárias.
- Doses mais altas:
- Estudos sugerem melhor resposta clínica com doses ≥ 6 mg/kg.
- Doses de até 12 mg/kg foram estudadas em voluntários e mostraram boa tolerância.
Nota: O peso corporal total deve ser usado para a dosagem. Em pacientes obesos (> 111 kg), alguns autores recomendam o uso do peso corporal magro.
Ajuste de Dose em Insuficiência Renal
- CrCL > 30 ml/min: dosagem usual IV a cada 24h.
- CrCL ≤ 30 ml/min: dosagem IV a cada 48h.
- Hemodiálise (HD): 6 mg/kg após cada sessão de HD, com dose adicional de 50% na última sessão antes do intervalo interdialítico de 72h.
- Diálise peritoneal (DP): 6 mg/kg IV a cada 48h.
- Terapia de substituição renal contínua (CRRT): dose usual IV a cada 24-48h, dependendo das taxas de fluxo de diálise.
Uso Pediátrico
- Infecção de pele e tecidos moles:
- 1-2 anos: 10 mg/kg IV a cada 24h.
- 2-6 anos: 9 mg/kg IV a cada 24h.
- 7-11 anos: 7 mg/kg IV a cada 24h.
- 12-17 anos: 5 mg/kg IV a cada 24h.
- Bacteremia por S. aureus:
- 1-6 anos: 12 mg/kg IV a cada 24h.
- 7-11 anos: 9 mg/kg IV a cada 24h.
- 12-17 anos: 7 mg/kg IV a cada 24h.
- Endocardite por S. aureus (MRSA ou resistente à vancomicina):
- < 6 anos: 10 mg/kg IV a cada 24h.
- ≥ 6 anos: 6 mg/kg IV a cada 24h.
- Osteomielite/Artrite séptica por MRSA: 6-10 mg/kg IV a cada 24h.
Nota: A infusão deve ser feita em 30-60 minutos para minimizar reações adversas.
Efeitos Adversos
- Comuns: Diarreia, cefaleia, tontura.
- Ocasional:
- Elevação dose-dependente de CPK (associada a miopatia).
- Prolongamento falso do INR (sem efeito anticoagulante in vivo).
- Raros:
- Rabdomiólise.
- Neuropatia periférica.
- Pneumonia eosinofílica (pode levar à insuficiência respiratória).
- Elevações de enzimas hepáticas (fosfatase alcalina, LDH).
Interações Medicamentosas
- Estatinas: Recomenda-se suspender durante o tratamento com daptomicina devido ao risco de miopatia.
- Varfarina, tobramicina, aztreonam e probenecida: Sem interações significativas conhecidas.
Resistência Bacteriana
- Enterococcus faecium com mutações liaFSR podem apresentar falha terapêutica apesar da suscetibilidade in vitro.
- Resistência ao S. aureus tem sido relatada em pacientes com infecções de alto inóculo ou exposição prévia à vancomicina.
- 80% dos isolados de VISA (Staphylococcus aureus com resistência intermediária à vancomicina) demonstraram resistência à daptomicina.
Farmacocinética e Farmacodinâmica
- Absorção: Má absorção oral.
- Excreção: 78% excretada inalterada na urina.
- Ligação proteica: 92%.
- Meia-vida: 8,1 horas.
- Distribuição:
- Penetração mínima no SNC.
- Baixa penetração óssea (apesar de sucesso clínico na osteomielite).
- Alta concentração na corrente sanguínea e tecidos moles.
Uso na Gravidez e Lactação
- Gravidez: Categoria B (segura em modelos animais, sem teratogenicidade).
- Lactação: Excretada no leite materno, mas com baixa exposição ao lactente.
Considerações Finais
A daptomicina é uma opção eficaz para infecções graves por Gram-positivos resistentes. No entanto, deve ser utilizada com cautela em infecções de alto inóculo e em pacientes com risco de resistência. Seu uso adequado e monitoramento laboratorial são essenciais para garantir eficácia terapêutica e minimizar toxicidades.