A clindamicina é um antibiótico pertencente a classe das lincosamidas, amplamente utilizada para o tratamento de infecções bacterianas graves. Seu mecanismo de ação envolve a inibição da síntese proteica bacteriana, tornando-a eficaz contra infecções por cocos Gram-positivos e anaeróbios. No entanto, seu uso deve ser criterioso devido ao risco crescente de resistência bacteriana, especialmente Bacteroides fragilis. Este artigo explora as indicações, posologia, efeitos adversos, interações medicamentosas e aspectos farmacológicos da clindamicina.
Indicações Clínicas
A clindamicina é aprovada pelo FDA para tratar diversas infecções, incluindo:
- Infecções da pele e tecidos moles: causadas por Streptococcus spp., Staphylococcus aureus e anaeróbios.
- Infecções pélvicas: como endometrite, abscesso tubo-ovariano, celulite pélvica e infecções pós-cirúrgicas da cúpula vaginal.
- Infecções intra-abdominais: peritonite e abscessos intra-abdominais causados por anaeróbios.
- Infecções respiratórias: como empiema, pneumonite e abscesso pulmonar por Streptococcus pneumoniae.
- Septicemia (não mais recomendada como tratamento de primeira linha).
- Acne vulgaris (uso tópico).
- Vaginose bacteriana: administração intravaginal em mulheres não grávidas e em gestantes no segundo e terceiro trimestres.
Uso “Off-label”:
- Tratamento alternativo de pneumonia por Pneumocystis jirovecii (PCP) em combinação com primaquina.
- Terapia alternativa para toxoplasmose do SNC, associada a pirimetamina e leucovorina.
- Infecções de pele e tecidos moles causadas por MRSA.
- Fasceíte necrosante e gangrena de Fournier (em combinação com outros agentes para inibir a produção de toxinas).
- Abscessos orais em pacientes alérgicos a penicilinas.
- Sinusite bacteriana aguda.
- Profilaxia intraparto para Streptococcus do grupo B (quando testada sensibilidade ao antibiótico).
- Actinomicose.
- Osteomielite.
- Malária não grave como regime alternativo, especialmente na gravidez.
- Difteria.
- Terapia alternativa para babesiose em combinação com quinina.
Mecanismo de Ação
A clindamicina atua inibindo a síntese proteica bacteriana ao se ligar à subunidade 50S do ribossomo, bloqueando a transpeptidação e a elongação da cadeia polipeptídica. Isso interfere no crescimento bacteriano, tornando-a eficaz contra anaeróbios e cocos Gram-positivos.
Formulação disponível
- Cápsulas: 300 mg por cápsula.
- Injetável IM/IV: 600 mg/4 mL por frasco-ampola.
Posologia e Administração
Uso adulto
- Infecções de pele e tecidos moles: 300-450 mg VO a cada 6-8h ou 600 mg IV a cada 8h.
- Fasceíte necrosante: 600-900 mg IV a cada 8h.
- Doença inflamatória pélvica: 900 mg IV a cada 8h (associada à gentamicina).
- Osteomielite: 600-900 mg IV a cada 8h ou 300-450 mg VO a cada 6h.
- Sinusite bacteriana aguda: 300 mg VO a cada 6h.
- Actinomicose: 600 mg IV a cada 8h por 2-6 semanas, seguido de 300 mg VO a cada 6h por 6-12 meses.
- Pneumocistose: 600 mg IV a cada 6-8h ou 300-450 mg VO a cada 6-8h + primaquina 15-30 mg VO uma vez ao dia.
- Neurotoxoplasmose: 600 mg IV a cada 6h ou 450-600 mg VO a cada 6h + pirimetamina + leucovorina.
Uso Pediátrico
- Neonatos: 5-7,5 mg/kg/dose IV ou VO.
- Crianças e adolescentes:
- IV: 20-40 mg/kg/dia dividido a cada 6-8h (máx. 900 mg/dose).
- VO: 20-30 mg/kg/dia dividido a cada 6-8h (máx. 450 mg/dose).
Efeitos Adversos
- Comuns: Diarreia, náusea, vômito e anorexia.
- Ocasional: Erupção cutânea morbiliforme, colite por Clostridioides difficile (~6%).
- Raros: Hepatotoxicidade, síndrome de Stevens-Johnson, broncoespasmo (pacientes com hipersensibilidade à aspirina).
Interações Medicamentosas
- Eritromicina: Antagonismo in vitro.
- Caulim-pectina: Reduz a absorção de clindamicina.
- Loperamida e difenoxilato/atropina: Aumentam o risco de colite associada a C. difficile.
- Relaxantes musculares não despolarizantes: Potencializam o efeito, aumentando o risco de depressão respiratória.
Resistência Bacteriana
- O principal mecanismo de resistência ocorre por modificação do sítio de ação e bombas de efluxo.
- A resistência cruzada pode ocorrer com macrolídeos e estreptograminas (fenótipo MLSB).
- Aumento da resistência ao Streptococcus do grupo B tem sido observado (~33-38%).
- B. fragilis: resistência crescente (~40% dos isolados nos EUA).
Farmacocinética e Farmacodinâmica
- Absorção: 90% absorvida por via oral.
- Metabolismo: Hepático (metabolizado em sulfóxido e N-dimetil).
- Excreção: Principalmente pelas fezes e bile (~90%), apenas 10% na urina.
- Ligação às proteínas plasmáticas: 85-94%.
- Meia-vida: 2,4 horas.
- Distribuição: Atinge fluido ascítico, pleural, sinovial, ósseo, biliar e saliva. Baixa penetração no SNC.
Uso na Gravidez e Lactação
- Gravidez: Categoria B (estudos sugerem segurança no primeiro trimestre).
- Lactação: Excretada no leite materno. Considerada compatível pela Academia Americana de Pediatria.
Considerações Finais
A clindamicina é um antibiótico versátil, eficaz contra anaeróbios e cocos Gram-positivos. No entanto, seu uso deve ser cauteloso devido ao risco de colite por C. difficile e resistência emergente. Seu papel em infecções graves, como fasceíte necrosante, permanece fundamental quando combinada a outros agentes antimicrobianos.