A Salmonella typhi é um bacilo Gram-negativo aeróbico facultativo, pertencente à família Enterobacteriaceae. Trata-se do agente causador da febre tifoide, uma infecção sistêmica grave caracterizada por febre prolongada, dor abdominal, cefaleia e manifestações gastrointestinais. A transmissão ocorre principalmente pela ingestão de alimentos ou água contaminados e, ocasionalmente, por contato pessoa a pessoa.
A febre tifoide é endêmica em regiões de saneamento inadequado, especialmente em países da Ásia, África e América Latina. Estima-se que ocorram cerca de 21 milhões de casos por ano, resultando em aproximadamente 200 mil óbitos globalmente.
Microbiologia
- Bacilo Gram-negativo, aeróbico facultativo.
- Não fermentador de lactose, oxidase-negativo.
- Produz gás de H₂S.
- Cresce em meios enriquecidos como caldo tetrationato ou selenito.
- Principal sorovariante: Salmonella enterica subespécie enterica sorovar Typhi.
Reservatórios e Transmissão
- O único reservatório natural é o ser humano.
- A transmissão ocorre por meio da ingestão de alimentos ou água contaminados.
- Portadores crônicos (gastrointestinal): podem eliminar a bactéria nas fezes por mais de um ano, mantendo a transmissão comunitária.
Epidemiologia
- Alta prevalência em áreas de saneamento precário.
- Associação com viagens para regiões endêmicas, como Ásia (Índia, Paquistão, Bangladesh).
- Nos EUA, a maioria dos casos está associada a viagens internacionais.
- Epidemias podem ocorrer devido à contaminação de fontes de água ou alimentos.
- O estado de portador crônico ocorre em cerca de 1-4% dos pacientes.
Manifestações Clínicas
1. Febre Tifoide
- Período de incubação: 6 a 30 dias.
- Sintomas iniciais:
- Febre prolongada (103-104°F).
- Cefaleia intensa.
- Mal-estar e fadiga.
- Dor abdominal.
- Manifestações gastrointestinais:
- Diarreia leve ou constipação.
- Hepatoesplenomegalia.
- Complicações tardias (sem tratamento):
- Perfuração intestinal e hemorragia gastrointestinal (~10% dos casos).
- Miocardite e encefalopatia.
- Endocardite e osteomielite (principalmente em pacientes com anemia falciforme).
- Sinal de Faget (bradicardia relativa).
2. Portador Crônico
- Portadores crônicos eliminam S. typhi nas fezes por mais de um ano.
- Maior risco em mulheres idosas com doença biliar.
- Colecistectomia pode ser necessária para erradicação.
Diagnóstico
O tratamento não deve ser retardado enquanto aguarda os resultados laboratoriais.
1. Cultura Bacteriana
- Hemocultura: positivo em até 50% dos casos.
- Aspirado de medula óssea: sensibilidade de até 80%.
- Coprocultura: útil em fases mais tardias da doença.
- Urocultura: positivo em alguns casos.
- Duodenoscopia: pode detectar em portadores crônicos.
2. Testes Sorológicos
- Teste de Widal: pouco sensível e específico, utilizado apenas em regiões de poucos recursos.
3. Testes Moleculares
- PCR: útil para detecção rápida, especialmente em casos graves.
Tratamento
A terapia empírica deve ser iniciada imediatamente na suspeita de febre tifoide.
1. Antibióticos de Primeira Linha
- Ceftriaxona 1-2 g IV/dia por 7-10 dias.
- Azitromicina 500 mg VO/IV 1x/dia por 7 dias.
2. Alternativas
- Meropenem 1 g IV a cada 8h: usado em infecções por cepas XDR (Extensively Drug-Resistant).
- Ciprofloxacino 500 mg VO 2x/dia por 7-10 dias: limitado devido à resistência crescente.
3. Terapia em Portadores Crônicos
- Ciprofloxacino 500 mg VO 2x/dia por 4-6 semanas.
- Amoxicilina 500 mg VO 3x/dia por 6 semanas.
- TMP/SMX 1 DS VO 2x/dia por 6 semanas.
- Colecistectomia pode ser necessária em casos persistentes.
Prevenção e Controle
1. Vacinação
- Vacina oral de vírus vivo atenuado (Ty21a):
- 4 doses em dias alternados, com proteção de até 5 anos.
- Vacina polissacarídica Vi injetável:
- Dose única, reforço a cada 2 anos.
2. Medidas de Controle
- Saneamento básico adequado e higiene alimentar.
- Educação sobre práticas seguras de preparo de alimentos.
- Imunização para viajantes a áreas endêmicas.
Conclusão
A febre tifoide é uma doença potencialmente grave, especialmente em regiões de saneamento inadequado. A introdução de vacinas eficazes e tratamentos precoces com antibióticos apropriados são essenciais para reduzir a morbidade e mortalidade. A prevenção depende de boas práticas de higiene e vacinação em populações de risco.
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Referência
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