Doença de Lyme:

A Doença de Lyme é a infecção transmitida por carrapatos mais comum nos Estados Unidos e Europa, sendo causada pelo complexo Borrelia burgdorferi sensu lato. Nos EUA, a única espécie patogênica é B. burgdorferi sensu stricto, enquanto na Europa também são descritas B. garinii, B. afzelii e B. bavariensis.

A Doença de Lyme é a infecção transmitida por carrapatos mais comum nos Estados Unidos e Europa, sendo causada pelo complexo Borrelia burgdorferi sensu lato. Nos EUA, a única espécie patogênica é B. burgdorferi sensu stricto, enquanto na Europa também são descritas B. garinii, B. afzelii e B. bavariensis.

A doença foi descrita pela primeira vez em 1976 em Lyme, Connecticut, e é hoje responsável por 300.000 a 450.000 casos anuais nos EUA. A transmissão ocorre através de carrapatos do gênero Ixodes, com maior prevalência em regiões endêmicas dos EUA, como Nova Inglaterra, Meio-Atlântico, Wisconsin e Minnesota.

A infecção pode se manifestar de forma localizada, disseminada precoce ou tardia, com envolvimento cutâneo, neurológico, cardíaco e articular.

Microbiologia e Vetores

  • Agente etiológico: Borrelia burgdorferi (EUA) e B. garinii/B. afzelii (Europa).
  • Transmissão:
    • Ixodes scapularis: vetor na Costa Leste, Meio-Oeste e Atlântico.
    • Ixodes pacificus: vetor na Costa Oeste dos EUA.
  • Tempo de transmissão: requer ≥ 36-48 horas de fixação do carrapato.

Os carrapatos também podem transmitir Anaplasma phagocytophilum, Babesia spp., Borrelia miyamotoi e vírus Powassan.

Manifestações Clínicas

A infecção evolui em três fases clínicas, podendo progredir para envolvimento neurológico, cardíaco ou articular.

1. Doença de Lyme Localizada (3-30 dias após a picada)

  • Eritema Migratório (EM):
    • Lesão >5 cm, expansiva, ovalada ou em “alvo”.
    • Ocorre em 80-90% dos casos.
    • Diferencial: celulite, micose, STARI (Southern Tick-Associated Rash Illness).
  • Sintomas sistêmicos:
    • Febre, cefaleia, mialgia, fadiga, artralgia (semelhante a um quadro gripal).
    • Serologia geralmente negativa nessa fase.

2. Doença de Lyme Disseminada Precoce (3-30 dias)

  • Múltiplas lesões de eritema migratório (menores e mais pálidas).
  • Neuroborreliose (12-14% dos casos):
    • Paralisia de nervo craniano (CN VII – mais comum).
    • Meningite linfocitária.
    • Radiculoneurite dolorosa (síndrome de Bannwarth).
  • Cardite de Lyme (1%):
    • Bloqueio A-V de 1º, 2º ou 3º grau.
    • Miocardite rara, mas descrita.
    • Pode causar síncope e palpitações.

3. Doença de Lyme Tardia (>1 ano)

  • Artrite de Lyme (30% dos casos não tratados):
    • Monoartrite ou oligoartrite intermitente, principalmente em joelhos.
    • Pode recorrer ou persistir sem tratamento.
  • Neuropatia periférica:
    • Sensação de formigamento/dormência.
    • Encefalopatia de Lyme (raro).
  • Manifestações cutâneas (Europa):
    • Linfocitoma borreliano: acomete o lóbulo da orelha ou mamilo.
    • Acrodermatite crônica atrófica: lesões azuladas/eritematosas nas extremidades.

Diagnóstico

1. Diagnóstico Clínico

  • Eritema migratório típico ≥5 cm em região endêmicadiagnóstico clínico (sem necessidade de exames).
  • Manifestações sistêmicas ou atípicastestes laboratoriais indicados.

2. Testes Laboratoriais

  • Sorologia (Teste de 2 Etapas – STTT):
    • ELISA (EIA) → Western Blot (WB) (IgM e IgG).
    • IgM: positivo apenas nas primeiras 4-6 semanas.
    • IgG: positivo em 100% dos casos tardios.
  • PCR (LCR ou líquido sinovial):
    • Baixa sensibilidade para a meningite de Lyme.
    • Útil para artrite de Lyme.
  • Teste de índice de Lyme no LCR:
    • CSF:IgG ratio > 1.2 sugere neuroborreliose.

Não solicitar sorologia sem sintomas compatíveis, pois a positividade pode persistir por anos após a infecção.

Tratamento

O tratamento precoce previne complicações tardias. A escolha do antibiótico depende da fase e do órgão afetado.

1. Eritema Migratório e Doença Leve

  • Doxiciclina 100 mg VO 2x/dia por 10 dias (primeira escolha).
  • Alternativas:
    • Amoxicilina 500 mg VO 3x/dia por 14 dias.
    • Cefuroxima 500 mg VO 2x/dia por 14 dias.
    • Azitromicina 500 mg VO 1x/dia por 7 dias (menos eficaz).

2. Neuroborreliose e Cardite

  • Doxiciclina 100 mg VO 2x/dia por 14-21 dias.
  • Casos graves (ex.: meningite, bloqueio cardíaco avançado):
    • Ceftriaxona 2 g IV 1x/dia por 14-21 dias.
    • Alternativas: Cefotaxima IV ou Penicilina G IV.

3. Artrite de Lyme

  • Doxiciclina 100 mg VO 2x/dia por 28 dias.
  • Casos refratários: Ceftriaxona IV por 14 dias.

Prevenção

1. Medidas Preventivas

  • Uso de roupas claras, mangas longas e calças em áreas endêmicas.
  • Inspeção corporal após atividades ao ar livre.
  • Uso de repelentes (DEET, picaridina, permetrina).
  • Remoção rápida de carrapatos (<24-36h reduz risco de infecção).

2. Profilaxia Pós-Exposição

  • Doxiciclina 200 mg VO dose única, se:
    • Carrapato identificado como Ixodes.
    • Permanência ≥36h.
    • Endemia alta (>20% dos carrapatos infectados).
    • Profilaxia iniciada ≤72h após remoção.

Conclusão

A Doença de Lyme é uma infecção complexa com manifestações multissistêmicas. O diagnóstico precoce e o tratamento adequado evitam complicações tardias. A profilaxia com doxiciclina é indicada em exposições de alto risco, enquanto medidas preventivas são essenciais para reduzir a incidência da doença.

📚 Isso foi só um aperitivo. No App do InfectoCast tem conteúdo aprofundado, confiável e sempre atualizado pra quem vive a medicina de verdade.
📲 Baixe agora e eleve seu raciocínio clínico.

Referências

  1. Lantos PM, Rumbaugh J, Bockenstedt LK, et al. Clinical practice guidelines for Lyme disease. Neurology. 2020. [PMID:33257476].
  2. Stupica D, Collinet-Adler S, Blagus R, et al. Treatment of erythema migrans with doxycycline for 7 vs. 14 days. Lancet Infect Dis. 2023. [PMID:36209759].
  3. Kortela E, Kanerva MJ, Puustinen J, et al. Oral Doxycycline vs. IV Ceftriaxone for Lyme Neuroborreliosis. Clin Infect Dis. 2021. [PMID:32133487].

Posts Relacionados

Estrutura Mínima para Garantir Segurança em Serviços de Oftalmologia com Alto Volume de Procedimentos

Controle de Infecção em Ambulatórios Oftalmológicos: Onde Estão os Riscos Invisíveis?

SIREVA 2024

O Instituto Adolfo Lutz, em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), divulgou os dados atualizados do Sistema Regional de Vacinas (SIREVA) para o ano de 2023, destacando o perfil microbiológico e sorotípico das cepas invasivas de Streptococcus pneumoniae circulantes no Brasil.

Claritromicina

A claritromicina é um antibiótico versátil e eficaz, sendo uma escolha primária para infecções respiratórias, H. pylori e micobacterioses. Entretanto, suas interações medicamentosas e o risco de prolongamento do QTc exigem monitoramento cuidadoso.

Azitromicina

A azitromicina é um antibiótico versátil e bem tolerado, sendo uma opção valiosa para infecções respiratórias, gastrointestinais e sexualmente transmissíveis. No entanto, o aumento da resistência e os riscos cardíacos requerem uso criterioso e monitoramento adequado.

Vancomicina

A vancomicina continua sendo uma opção essencial para o tratamento de infecções graves por MRSA e C. difficile. No entanto, seu uso deve ser monitorado rigorosamente para evitar toxicidade renal e falhas terapêuticas. O monitoramento da AUC/MIC emergiu como um novo padrão para otimizar eficácia e minimizar efeitos adversos.